28 de abril de 2009

Objeto direto

O senhor que fumava ao meu lado tossiu, mas parecia um riso tão original que resolvi perguntar as horas. Ele respondeu e acrescentou toda a sua previsão para o clima, toda a sua epopéia da juventude, sua pequena biografia comentada, suas posses de terrenos e carros, a história dos seus filhos, idades, constituições, cidades onde moravam, número de netos, possíveis desejos de profissões...
Se não fosse pelo café extremamente doce e fraco, pelo pedaço de pizza requentado com a pior mussarela e o pior apresuntado, nenhuma parada de ônibus merecia existir.
Numa viagem de ônibus, os passageiros sentados à frente são passíveis de múltiplas análises: a escolha pelo kibe, pelo sorvete de cone, pelo chicletes de melância, pela camiseta levemente rósea, pelo toque de celular. Passíveis de análise, sobretudo, se sua viagem ultrapassar as 7 horas sentadas. Sobretudo se o ar condicionado estiver congelando seus joelhos. Sobretudo se houver duas crianças correndo e chorando pelo ônibus. Sobretudo se os passageiros insistirem em comer todos os tipos de fritura associados à banana maçã e mexerica poncan, logo após o desinfetante sabor tutti-frutti usado para a higienização do banheiro ter chego aos seus acuados sentidos.
Trecho digno da Angústia do Graciliano Ramos.